A importância do laudo de capacidade financeira para a prorrogação das dívidas rurais de custeio
- paulob2
- 6 de out.
- 4 min de leitura

Produtores rurais de todo o Brasil enfrentam, com frequência, desafios que comprometem sua capacidade de pagamento: estiagens prolongadas, excesso de chuvas, queda nos preços de commodities, pragas e outros fatores fora do seu controle.
Diante dessas situações, o crédito rural — instrumento essencial para a manutenção da atividade agropecuária — dispõe de mecanismos que permitem ao produtor solicitar a prorrogação ou o alongamento da dívida.
Entretanto, para que esse direito seja reconhecido e deferido, é indispensável a comprovação técnica da dificuldade temporária de pagamento, por meio do chamado laudo de capacidade financeira.
Este artigo explica por que esse documento é fundamental, quais são seus requisitos e como o produtor pode utilizá-lo corretamente em pedidos administrativos e judiciais.
O regime jurídico da prorrogação do crédito rural
A Lei nº 4.829/65, que instituiu o crédito rural, tem natureza especial e finalidade social: fomentar a produção agrícola e assegurar a continuidade das atividades do campo, consideradas essenciais à economia e à segurança alimentar do país.
O Manual de Crédito Rural (MCR), editado pelo Banco Central, detalha as condições para prorrogação de dívidas. O dispositivo MCR 2.6.4 estabelece que a prorrogação poderá ser concedida “aos mesmos encargos pactuados”, quando o mutuário comprovar dificuldade temporária de reembolso em decorrência de fatores adversos.
Esses fatores incluem:
Frustração de safra por intempéries ou pragas;
Dificuldades de comercialização dos produtos agrícolas;
Problemas climáticos, logísticos ou econômicos que prejudiquem a atividade rural.
O produtor que comprovar essas condições tem direito subjetivo à prorrogação, e não mera liberalidade do banco. Esse entendimento foi consolidado pela Súmula 298 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual:
“O alongamento de dívida originada de crédito rural não constitui faculdade da instituição financeira, mas direito do devedor nos termos da lei.”
Por que o laudo de capacidade financeira é indispensável
O laudo de capacidade financeira (também chamado de laudo de capacidade de pagamento) é o documento técnico que demonstra, de forma objetiva, a real situação econômica do produtor rural e o impacto dos fatores externos sobre sua receita.
Esse laudo deve comprovar dois pontos principais:
A ocorrência de evento adverso que reduziu temporariamente a capacidade de pagamento (ex.: seca, pragas, queda de preços, aumento inesperado de custos).
A viabilidade futura da atividade, indicando que, com a prorrogação, o produtor poderá honrar o novo cronograma de pagamento.
Em outras palavras, o laudo serve para demonstrar que o problema é temporário e superável, e que o produtor mantém condições de continuar a produzir e pagar.
Base legal e função probatória
A exigência do laudo decorre diretamente do MCR 2.6.4, que condiciona a prorrogação à “comprovação da incapacidade temporária de pagamento e da viabilidade de reembolso futuro”.
Na prática, trata-se de um documento técnico de natureza contábil, agronômica e financeira, geralmente elaborado por profissionais habilitados (engenheiros agrônomos, economistas ou contadores) que analisam:
Produção prevista x produção efetiva;
Impactos climáticos e biológicos sobre a safra;
Variações de preço de insumos e produtos;
Custos operacionais e fluxo de caixa projetado;
Dados contábeis e fiscais do empreendimento rural.
O laudo tem alto valor probatório tanto na esfera administrativa quanto judicial. Sua ausência costuma ser o principal motivo de indeferimento de pedidos de prorrogação.
A prática administrativa e judicial
Embora o direito à prorrogação seja garantido por lei, muitos bancos resistem em concedê-la, alegando insuficiência de provas ou irregularidades formais.
Por isso, é fundamental que o produtor protocole o pedido de forma formal e documentada, instruindo-o com o laudo de capacidade financeira e demais provas complementares (notas fiscais, relatórios técnicos, registros climáticos, contratos de venda, etc.).
Quando o banco se nega a analisar ou indefere o pedido de forma indevida, o produtor pode recorrer ao Poder Judiciário, por meio de ação declaratória de direito à prorrogação ou ação mandamental com pedido de tutela de urgência.
A jurisprudência tem reconhecido reiteradamente que, uma vez comprovados os requisitos legais e técnicos, o alongamento é um direito do produtor — e não uma opção do credor.
Elementos essenciais de um bom laudo de capacidade financeira
Um laudo robusto deve conter, no mínimo:
Identificação do evento adverso e suas causas (climáticas, econômicas ou biológicas);
Diagnóstico técnico da atividade rural impactada;
Comparativo entre produção esperada e realizada;
Fluxo de caixa histórico e projetado, demonstrando o desequilíbrio e a viabilidade futura;
Comprovação documental dos fatos (notas fiscais, laudos meteorológicos, boletins agrícolas, registros de comercialização etc.);
Conclusão técnica clara, demonstrando que a prorrogação permitirá o adimplemento futuro da dívida.
Importância estratégica para o advogado e o produtor
Na esfera jurídica, o laudo é o principal instrumento de convencimento técnico do juiz. Sem ele, o pedido de prorrogação torna-se genérico e pode ser indeferido por falta de prova concreta da dificuldade temporária.
Por isso, é essencial que o advogado especializado em direito agrário e crédito rural oriente o cliente desde o início do processo administrativo, acompanhando a elaboração do laudo e garantindo que ele atenda aos parâmetros exigidos pelo Banco Central e pela jurisprudência do STJ.
Em muitos casos, o laudo bem elaborado antecipa objeções do banco e reduz significativamente o tempo de tramitação administrativa ou judicial.
Conclusão
A prorrogação da dívida rural é um direito do produtor, mas sua concessão depende de uma demonstração técnica séria e fundamentada de que o problema financeiro é temporário e que a atividade se mantém viável.
As dividas de custeio rural pode ser prorrogada custeio
O laudo de capacidade financeira é o instrumento que dá sustentação a esse direito — e, sem ele, dificilmente o pedido será acolhido.
No atual cenário de incertezas climáticas e econômicas, contar com assessoria jurídica e técnica especializada é essencial para proteger o patrimônio e a continuidade da produção.
Sobre o autor
Paulo Bernardo Filho é sócio do Gracia Bernardo Filho Advogados, escritório sediado em São Paulo, com atuação nacional, especializado em Direito Agrário e Renegociação de Dívidas Rurais.
Com mais de uma década de experiência e centenas de produtores atendidos, o escritório atua na defesa de agricultores e pecuaristas em negociações com bancos, ações judiciais de prorrogação e reestruturação de crédito rural.
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